Convenções sociais, máscaras e rótulos

24 de Maio de 2021

A vida em sociedade requer, desde cedo, uma linguagem comum e implicitamente aceite por todos, sendo passada através da educação.

Esta linguagem comum baseia-se em:

– leis (o que é proibido num lugar poderá não ser noutro e as pessoas comportam-se de acordo com a licitude ou ilicitude dos actos);

– normas de conduta (como tratar, como cumprimentar, que distância manter para com os outros, etc.);

– regras de boa educação e de boas maneiras (dizer bom dia, obrigada, por favor, não interromper os outros, comer de boca fechada, olhar para as pessoas quando se está a falar com elas, etc.);

– etiqueta (levantar-se para cumprimentar alguém, vestir-se de forma adequada à ocasião, agradecer um convite, etc.);

– cortesia (abrir a porta a alguém, ajudar uma pessoa com dificuldades a atravessar a rua, segurar a porta do elevador); e

– civilidade (não passar à frente dos outros, colocar a mão à frente da boca quando se tosse ou espirra – a convenção mudou e, actualmente, será tossir ou espirrar para a parte interna do cotovelo –, não colocar aparelhos "aos altos berros", etc.).

Estas regras fazem parte do teu dia-a-dia e é importante que as saibamos reconhecer e aplicar, sob pena de seres considerado mal-educado ou incivilizado. Por isso, é importante que adoptes a postura correcta para cada situação, adaptando o teu comportamento. Às vezes não é fácil, mas, em caso de dúvida, mais é sempre melhor: mais formal é melhor do que demasiado informal, mais educado é melhor do que mal-educado.

As convenções sociais

Como podes ver, muitas destas regras estão relacionadas entre si e todas são convenções sociais que podem variar no tempo (hoje, a sociedade e as normas sociais são diferentes daquilo que eram há um século atrás ou para a geração anterior à tua) e no espaço:

–  a família (algumas famílias tratam-se por "tu" e acham demasiado impessoal tratar os familiares mais próximos por "você", enquanto para outras famílias o tratamento por "tu" de pessoas mais velhas é considerado falta de educação);

– o bairro/cidade (em alguns sítios, é normal que as pessoas andem "na casa uns dos outros", enquanto noutros a convivência é mais distante);

– o estrato social/hierarquia (a formalidade depende da hierarquia dos participantes entre si – pais e filhos, patrões e empregados, médicos e pacientes, etc. – e/ou as regras mudam conforme o estrato económico-social – num restaurante de rua não se mete uma mesa como se mete num restaurante galardoado, mas ambos têm "a sua forma correcta" de o fazer);

– o país (um acto que em Portugal é sinal de educação, noutro país, com uma cultura diferente, pode ser uma ofensa ou vice-versa – sabias que há países em que arrotar à mesa é um elogio para o anfitrião?);

– o ambiente laboral (mais formal ou mais informal, mais hierarquizado ou mais aberto, mais cerimonioso ou mais descontraído – se num sítio vestir uma camisa e umas calças de sarja é considerado formal, noutros essa é a vestimenta adequada a uma sexta-feira casual), entre outros.

No fundo, todas estas convenções são preceitos que dizem respeito ao saber-ser, saber-estar e saber-viver e que manifestamos sob a forma de comportamentos sociais adequados a cada situação, cada lugar e cada período.

Estas acções encontram-se relacionadas com a nossa inteligência emocional e com a nossa capacidade de regularmos as nossas emoções em contexto social – e privado. Por isso, é importante que treines a tua flexibilidade mental para saberes responder adequadamente a cada desafio – não te vais pôr a contar piadas num funeral, pois não?

As máscaras

Ao fazermos a distinção entre contexto social e contexto privado trazemos à tona a ideia de que os nossos comportamentos variam se estamos na esfera privada (família, amigos e casa) ou na esfera pública (trabalho, meio social e fora de casa).

A essa mudança nos comportamentos – muitas vezes sujeita a convenções sociais – chamamos máscaras sociais ou papéis sociais.

No entanto, "usares uma máscara social" não significa que tens de fingir nem que tens de ser falso, significa apenas que tens de ter noção daquilo que é público (que não incomoda nem invade o espaço do outro) e daquilo que é privado (íntimo, pessoal, menos "policiado") e de te saberes adaptar às diferentes situações, mostrando algumas das tuas facetas consoante estas são mais ou menos pertinentes.

A verdade é que somos todos compostos por vários "eus". Não és com a tua cara-metade aquilo que és com um colega de trabalho, ou seja, existem coisas tuas e sobre ti que um conhece e o outro não; também é assim com as formas de estar, não estás tão à vontade com um vizinho que mal conheces como estás com um amigo e isso reflecte-se na forma como te comportas, como falas e o que falas.

É a gestão desses vários "eus" que te irá permitir que mantenhas a tua autenticidade sem seres inadequado: à pessoa que te faz uma entrevista de emprego não interessa se só começaste a falar aos 5 anos, mas para o terapeuta da fala poderá ser absolutamente imprescindível ter essa informação; continuas a ser tu, mesmo se não te refastelares na cadeira durante uma reunião e o fizeres mal entres em casa dos teus pais.

E, por falar em pais, a tua máscara também muda quando falas com eles e é necessariamente diferente daquela que usas quando falas com os teus irmãos ou com amigos ou com os teus professores, colegas de trabalho, chefes, pessoas que conheceste há pouco tempo, etc. Esta máscara traduz-se no teu tom de voz, no tipo de discurso que usas, na tua expressão e proximidade corporal, mas também naquilo que dizes – podes falar com os teus pais sobre um problema de saúde e não o comentares com os teus amigos (ou vice-versa), podes falar de problemas amorosos com os teus amigos e não o vais fazer com o teu empregado.

Estas tuas "personagens" – pai, filho, amigo, colega, empregado, patrão, vizinho, etc. – têm exigências e criam expectativas diferentes, pelo que deverás ter flexibilidade mental e inteligência emocional para te saberes adaptar a cada ambiente, mantendo o teu verdadeiro Eu sempre presente.

Quando sentires que te estás a afastar da pessoa que queres ser, dá um passo atrás e avalia se essa é uma mudança que tens e queres fazer ou se será melhor mudar de meio envolvente, para um meio onde te sintas mais confortável – mas, cuidado! Não te deixes ficar preso pelo receio da mudança.

Os rótulos

Na verdade, sempre que adaptas o teu comportamento à situação, estás a basear essa adaptação numa série de estereótipos que criaste para aquele ambiente ou sobre aquela pessoa: vais a uma reunião de trabalho e mostras uma conduta mais rígida e distante, adequada à formalidade e necessidade de assertividade da situação, apenas para descobrires que o teu interlocutor é uma pessoa mais dialogal, fazendo com que o teu comportamento mude em resposta à maior informalidade da situação. Lá está, usas a atitude mais formal para não seres visto como uma pessoa mal-educada ou que não sabe estar, mas também não queres passar por uma pessoa pouco acessível, por isso, ajustas as tuas atitudes à pessoa com quem te estás a relacionar, fazendo uso da empatia.

Pois bem, estes estereótipos nada mais são do que rótulos sociais, ou seja, um conjunto de características que associamos aos membros de um determinado grupo e aos seus padrões sociais: um profissional é uma pessoa séria e rígida (e será certamente em determinadas situações), o que não quer dizer que não possa ser uma acessível e até mais informal (mas sempre com respeito).

E se é bom que te adaptes às situações tendo em mente as características que reconheces num colectivo, é mau se rotulares – negativa ou positivamente – de forma inflexível todas as pessoas que fazem parte desse colectivo.

A palavra-chave aqui é "inflexível": os patrões são abusadores, os jovens são preguiçosos, é mais fácil trabalhar com homens, os mais velhos estão parados no tempo, a universidade é para snobes, os cursos profissionais são para os alunos menos inteligentes, entre muitas outras generalizações que restringem o nosso conhecimento do outro e que podem, em última instância, gerar preconceitos que limitam a nossa visão e a nossa acção – porque os preconceitos e os rótulos não se projectam apenas nos outros; por vezes, projectamo-los em nós mesmos.

Quantos de nós não tiveram já de lutar contra a ideia de que algo não é para nós porque não temos a idade, a raça, o sexo, a nacionalidade, a aparência física, a destreza mental, etc. que achamos que se espera de alguém que tem uma determinada profissão, por exemplo?

Quantos de nós não sentiram que era mais fácil ter boas notas se fosse rapariga ou arranjar um bom emprego se fosse homem ou ter um negócio se tivesse um "canudo"?

Quantos de nós não almejaram ter mais dinheiro para ter mais respeito ou ser mais bonito ou mais magro ou mais gordo ou mais conforme com aquilo que a sociedade idealiza como perfeito para que as coisas corressem melhor?

Ao fazermo-lo, estamos a amputar-nos e a amputarmos os outros:

  1. se achamos que dinheiro traz mais respeito, iremos respeitar menos as pessoas com menos dinheiro; se achamos que só o exterior conta para se ter sucesso, nunca iremos achar que uma pessoa fora desses padrões possa ser ou vir a ser bem-sucedida e iremos espelhar nessa pessoa (amigos, irmãos, filhos, colegas, etc.) as nossas próprias limitações e inseguranças;
  2. se não temos dinheiro (na quantidade idealizada como digna de respeito) ou o tal aspecto exterior, iremos deixar que nos desrespeitem e iremos desrespeitarmo-nos a nós mesmos, impondo-nos crenças limitadoras que irão bloquear o nosso desenvolvimento e a nossa capacidade de atingirmos os nossos objectivos.

Como já falei anteriormente, a escola é, neste momento, um perpetuador e um impulsionador de rótulos. Porquê? Porque trata pessoas diferentes da mesma forma.

Contudo, embora no papel exista uma evolução e uma adaptação aos tempos actuais – se é que falar em perfis, gerações e características geracionais é actualizar em vez de estereotipar –, na prática, as coisas mudaram muito pouco e continuamos a rotular as crianças e jovens através de binómios que se entrelaçam e se autojustificam: inteligente-burro, trabalhador-preguiçoso, atento-distraído, interessado-pouco participativo, universidade-escola profissional, vencedor-falhado.

É fácil de ver que estes binómios são extremamente limitadores e limitantes – para pais, professores e alunos – e incluem muitas variantes que não são tidas em conta, evidenciando inclusivamente alguns preconceitos que se irão reflectir nos nossos comportamentos. Afinal de contas:

– Temos todos o mesmo tipo de inteligência?

– Queremos todos ser académicos?

– Concentramo-nos todos da mesma maneira?

– Temos todos o mesmo tipo de personalidade?

– Somos e/ou valemos mais ou menos dependendo daquilo que fazemos?

– Temos todos as mesmas vivências?

Que aborrecido seria se fossemos todos iguais, mas parece que o ensino ainda não conseguiu perceber e trabalhar com essas diferenças – não digo que é fácil, porque existem mesmo muitas variantes, mas nunca chegaremos lá se não tentarmos ser mais empáticos e menos críticos.

Por isso, cabe-te a ti descobrires qual é o teu espaço (aquele em que te sentes bem e aquele em que estás inserido), quais são os teus preconceitos (que estão a limitar o teu conhecimento sobre as coisas e sobre as pessoas) e as tuas crenças limitadoras (que te estão a auto-restringir) para conseguires ir mais longe, não só na tua evolução e satisfação pessoal, mas também na tua relação com os outros. Conheceres-te é o primeiro passo – e, acredita, pode não ser fácil, mas é extremamente gratificante e eu estou aqui para te ajudar.

 

(este artigo foi escrito ao abrigo do antigo acordo ortográfico)

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